Relatório da assembleia “Retomar a cidade” (sábado 19 novembro 2022)


A Assembleia “Retomar a cidade” teve muito sucesso, uma centena de pessoas atravessaram o espaço da Sirigaita e muitas outras ficaram à porta. Percebemos que o movimento pela habitação está vivo e há ainda mais desejo de recomeçar um novo ciclo político de lutas depois do deserto da pandemia. Por toda a parte e constantemente, a lógica da acumulação capitalista perturba a nossa cidade e Lisboa é ainda mais uma cidade à venda e ainda menos uma cidade para ser vivida. O capitalismo também é, independentemente do nível que se considere, um sistema de produção espacial, ou seja, um poder de manipular lugares, de alterar profundamente os bairros, de transformar as relações espaciotemporais. A estandardização desta lógica implica, na realidade, uma proliferação incessante, por um lado, da mercantilização de todos os espaços da cidade, e por outro, dos despejos e da brutalidade das dinâmicas económicas que determinam as nossas vidas: é cada vez mais difícil pagar uma renda dados os níveis salariais em Portugal e a especulação imobiliária. Contra tudo isso, a assembleia de sábado falou claro: é preciso organizar-nos para enfrentar a situação atual, que está cada vez pior, mas o ponto central é que a lógica da casa está subordinada à lógica financeira e já há muitos anos que se fala da financeirização da habitação em Lisboa e em Portugal. Os recursos que poderiam ser colocados na habitação pública vão todos para o turismo, vistos Gold, mercado imobiliário, etc. e nós estamos cada vez mais pobres. Há pelo menos 48 000 casas vazias, e esta situação tão absurda fica ainda mais injusta frente aos preços das rendas, das contas e frente aos despejos. Falou-se até de uma “política de morte” da cidade e de “políticas de anti-habitação”. 

Contudo, como retomar uma “política da presença” numa cidade que é cada vez menos nossa? Como nos reapropriamos de sítios criados fora da lógica do lucro? A assembleia deu as boas-vindas ao novo fôlego do movimento estudantil e – junto às experiências que já há das ocupações – quer fortalecer esta prática. Foram várias as intervenções que apontaram a especulação imobiliária e legislação que a sustenta enquanto inimigas das pessoas que moram em Lisboa: de facto, “a lei é feita para a compra”. 

Em segundo lugar, muitas pessoas falaram que é preciso agarrar o poder, através de diversificação de ações, que incluam a ocupação de ruas e ações diretas contra os especuladores e os lugares que já gentrificaram. Basicamente, temos que ser ofensivos e não defensivos: ainda no seguimento de ações contra o poder foi referido o Referendo pela habitação, dado que as plataformas de alojamento local já temem “o efeito contágio” para outras cidades europeias. estas grandes plataformas já têm grupos de investigação para contestar as ações dos movimentos sociais. 

Em terceiro lugar, foi sublinhado como já muitas pessoas foram expulsas para as margens urbanas da cidade e cada vez mais a falta de uma boa estrutura de transportes afeta a vida quotidiana de muita gente, por isso um dos propósitos é multiplicar as lutas e as rebeldias também nas periferias. 

Em quarto lugar, a turistificação está a avançar ainda mais, também porque o Governo Costa decidiu fundar o seu projeto económico quase exclusivamente sobre esta dinâmica, junto ao projeto de atrair cada vez mais nómadas digitais, oferecendo um novo “paraíso fiscal” na Europa. Muitas vezes o dinheiro público é utilizado para campanhas de promoção do nosso país como um recreio ao ar livre, esquecendo as necessidades básicas da população. 

Por fim, como retomar a cidade? Quais práticas? Depois de duas horas de debate decidimos marcar outra assembleia no próximo sábado, dia 26 de novembro às 17h na Sirigaita. A ideia é dividirmo-nos em grupos de trabalho para organizarmos a nossa política insurgente, tendo como alvo a manifestação do European Housing Action Day, no final de março 2023.